Na televisão, o parto é um evento de urgência, que em geral é puro sofrimento, angústia e motivo de muitas orações. Na família, relatos de partos sofridos (os poucos normais que ocorreram) e muitas cesáreas (que hoje sei se foram desnecessárias), com direito a muito sofrimento e dor no pós-parto. Na literatura, cansei de ler sobre a maternidade e cheguei até mesmo a um livro que defendia o procedimento cirúrgico como melhor opção para o nascimento. Em relação aos médicos, soube apenas recentemente que, por formação e conveniência, a grande maioria induz ou indica diretamente a cesárea para pacientes absolutamente saudáveis e capazes de parir.
Assim, a primeira vez que ouvi falar em parto humanizado, portanto, o assunto me soou completamente distante da minha realidade. Pareceu-me algo muito radical, sem sentido, coisa de mulheres que se acham melhores que as outras por que têm coragem de ter um parto sem anestesia, e se vangloriam disso. Gente sem noção que não dimensiona o risco que corre por uma espécie de capricho hippie. Juro mesmo. Eu tinha um pré-conceito totalmente formado.
Mesmo assim, passei a me informar sobre o tema, talvez por curiosidade de entender o que levava aquelas mulheres a desejar algo tão “ultrapassado”. Afinal, com tantos recursos e adventos da medicina, por que parir como nos séculos passados? Assim, fui conhecendo o discurso e o vocabulário relacionado ao mundo do “parto humanizado”, inicialmente, por pura curiosidade sociológica.Li muitos relatos de parto e uma coisa me intrigava e me incomodava: o fato recorrente de médicos mentindo para pacientes para convencê-las de que “aquele caso” só a cesárea seria segura. Negando à suas pacientes, por formação deficitária, padrão cultural ou por pura conveniência financeira, a verdadeira oportunidade de decidir sobre o seu corpo, sua vida, seu parto, sua história. Aquilo me pegou. Sempre acreditei que as mulheres deveriam ter a opção de escolher como desejavam parir, mas percebi que nem isso lhes era garantido. E, iludida e inadvertidamente, só lhes restava a opção cirúrgica, muitas vezes realizada como “emergência”, mas marcada com 3 dias de antecedência...
Decidi, então, que não queria ser enganada. E comecei a compreender que para que isso de fato acontecesse seria preciso buscar um profissional verdadeira e reconhecidamente comprometido com a capacidade das mulheres de parir. Nesse caminho, logo perdi as esperanças de encontrar um profissional com tal conduta e que ao mesmo tempo atendesse a convênios médicos. Seria querer demais. Alguém disposto a passar horas e horas acompanhando uma paciente em trabalho de parto, desmarcando consultas, perdendo fins de semana, cancelando passeios e viagens para receber os honorários indignos pagos pelas seguradoras brasileiras.
Assim, já antes de engravidar, sabia que o caminho para um parto digno, fosse ele qual fosse, seria encontrar uma equipe de confiança, experiente e que me respeitasse como mulher. Pesquisei muito na internet e marquei uma consulta com um profissional que me pareceu seguir a linha que eu deseja. Consulta longa, muita conversa, muitas explicações, vídeos de parto. Naquela altura, o assunto “parto natural” ainda me dava muito medo. Medo da dor, do sofrimento, da recuperação, os ditos “estragos” causados pelo parto normal. Apenas uma coisa me fazia sentido, eu queria ter de verdade a oportunidade de ter um parto digno.
Meses depois, engravidei. Descobri na primeira semana de janeiro de 2010. Uma mistura imensa e intensa de alegria e pavor. Procurei o médico que eu havia conhecido e ele estava de férias, as secretárias não sabiam dizer quando ele voltaria, não quiseram me dar o celular. Eu começava a sentir alguns sintomas de mal estar e o tal “médico humanizado”, que tanto me prometeu no “primeiro encontro”, havia desaparecido na primeira necessidade. Fiquei insegura. Era minha primeira gestação e eu, que tanto tinha lido e acompanhado amigos e parentes grávidas, me vi um tanto perdida e sem saber o que fazer.
Nessa altura do campeonato, eu já havia conhecido e começado a participar de algumas listas de discussão por e-mail, ligadas ao parto humanizado, e, então, decidi escrever pedindo indicação de um profissional bacana. Uma pessoa muito querida me indicou a Dra. Andrea Campos. Confesso que, no início, quando soube que ela acompanhava partos domiciliares, achei que talvez ela fosse muito “naturalista” para mim. Ok, eu queria ter um parto normal, mas não me via parindo fora do ambiente “seguro” do Hospital, com direito a analgesia/ anestesia e toda a parafernália que eu tivesse direito.
Ainda assim, decidi conhecê-la. Se não gostasse, iria procurar outro profissional. O que eu não sabia é que é IMPOSSÍVEL não gostar da Andrea. Uma pessoa gentil, tranqüila, paciente, capacitada, doce, inteligente e muito, muito simpática. Na primeira consulta, fui com a minha irmã – que logicamente estava muito mais desconfiada daquela “médica meio bicho grilo” do que eu. Mas ela também sofreu o impacto do “não tem como não gostar da Andrea”. E saiu de lá achando muito bacana que eu tentasse o parto normal.
Daí em diante, a minha gravidez transcorreu muito tranquilamente. A calma e a gentileza da Andrea me deixavam muito segura e confiante. Em nenhum momento ela me pressionou, me aterrorizou, me deixou tensa. Sempre me explicava tudo com toda a paciência do mundo e sugeria as opções que considerava mais apropriadas para os eventuais percalços da gestação. Seguindo a linha antroposófica, da qual já havia me beneficiado na infância. (Veja como a vida é cíclica).
Durante toda a gravidez, participei dos encontros semanais de gestantes na Casa Moara, espaço dedicado ao atendimento humanizado relacionado ao nascimento – com atividades que vão desde yoga, fisioterapia, atendimento obstétrico, pediátrico, até encontros para gestante e mães. A cada semana eu aprendia algo novo, importante e, por vezes, inusitado. Assustava-me com a quantidade de informações desconhecidas que existem sobre o processo de nascimento. Coisas que TODAS as mulheres deveriam saber de cor e salteado. Aos poucos, centenas de tabus foram sendo desvendados, mitos derrubados, pré-conceitos desfeitos – tudo na base da informação, do questionamento e das experiências vividas por profissionais muito capacitados que emprestam, de bom grado, seu conhecimento a quem se interessar em aprender.
Pouco a pouco, fui desconstruindo dentro de mim o conceito de sofrimento no parto. Mas tinha medo da dor. Porém descobri que o medo é natural e que lidar com ele é a melhor maneira de enfrentá-lo. Preparei-me, li, busquei os melhores profissionais. Por que para mim era essencial saber, conhecer o processo que estava por vir para me sentir tranquila, segura e confiante. E assim tudo aconteceu.
Não posso deixar de citar também a importância das aulas de Yoga para gestantes. Foram fundamentais. Primeiramente, para me manter focada nos meus objetivos, conectada com a minha filha, centrada na capacidade do meu corpo de formar e colocar no mundo a minha princesa. E, principalmente, por que a minha querida professora, Kátia Barga, aceitou ser a minha doula e esse contato semanal, trocando informações, impressões e nos conhecendo profundamente foram determinantes e essenciais para que tudo tenha sido tão perfeito.
A Katia sempre acreditou em mim, na minha capacidade de parir e foi quem mais me passou segurança para acreditar que eu não necessitaria de analgesia. Eu pensava: como é que essa mulher sabe se eu vou aguentar? Rsrsrs. Pois é, ela sabia.
Hoje sei que o meu processo “pré-parto” me fez resgatar a minha essência feminina, retomar o contato com a minha força natural e ter a convicção de que, se eu havia sido capaz de gerar um bebê, era evidente que tinha todas as condições necessárias para colocá-lo no mundo! A sabedoria e a perfeição da natureza não podiam mais ser contestadas
A dor é inevitável, o sofrimento opcional.
Relato de Parto – Nascimento Isadora – 5 de setembro de 2011
Acordei no sábado (dia 04/09) por volta de 8h sentindo uma leve coliquinha. Foi uma sensação diferente, achei “suspeito”, mas sabia que poderiam ser apenas contraçõesinhas inocentes ou pródromos (contrações preparatórias, fora do trabalho de parto), que poderiam durar dias. Comentei com o Fábio, e estava muito tranquila. Fui para a minha aula de yoga para gestantes e durante os exercícios, especialmente no relaxamento, senti mais umas três vezes essa dorzinha leve – como uma cólica menstrual fraquinha mesmo. Ao longo da aula, a Katia Barga – instrutora de yoga para gestantes e minha doula – caprichou nos agachamentos e posturas para “estimular” o trabalho de parto. Digo estimular entre aspas, pois não há nada (natural) que seja capaz de provocar diretamente um trabalho de parto, mas é possível estimular o corpo a iniciar este processo. Pensei em comentar com a Katia sobre esses incômodos, mas ao final da aula tinha muita gente por perto e preferi não “alarmar” ninguém.
O Fábio foi me buscar e ao sairmos da Casa Moara – local onde acontecem as aulas, palestras para gestantes e onde minha médica atende – fomos na Alô Bebê comprar algumas coisinhas de última hora. Voltamos para casa e pensamos em sair para almoçar, mas preferi ficar em casa e descansar um pouco. Nessa fase da gravidez, tudo cansa. E achei que “se fosse o dia” era melhor descansar. Uma amiga veio almoçar conosco (comemos um belo nhoque), conversamos e demos risada. Não comentei nada com ela, pois de fato não sabia dizer se aquelas cólicas tinham algum significado maio
Fazia um calor terrível e grávida eu senti MUITO calor. Ficamos a tarde toda debaixo do ventilador, cochilei. O dia foi passando assim. À tarde avisei a Katia por torpedo e ela me recomendou repouso mesmo. Fui diversas vezes ao banheiro ao longo do dia e achei que esse era um sinal de que eu de fato poderia estar iniciando o trabalho de parto, afinal sabia que a perfeição da natureza faz com que o organismo faça uma espécie de limpeza intestinal natural antes do parto.
Ao final do dia, novamente pensamos em sair para comer alguma coisa, mas acabamos decidindo tomar um lanche na (ótima) padaria perto de casa. Fomos a pé. No caminho, notei que as contrações estavam curiosamente ritmadas – isso era por volta de 20h30. Jantamos e na volta decidimos contar as contrações para ter uma ideia de quantas vinham em uma hora e qual o intervalo. Entre 21h e 22h, contamos 10 contrações num intervalo de aproximadamente 6 minutos, com duração de uns 30-40 segundos mais ou menos. Avisamos a Katia novamente.
Ela decidiu comunicar a MK (parteira, enfermeira obstétrica, auxiliar da Andrea, querida, abençoada, hehe...), pois ela estava na Riviera com a família. Ela havia me ligado para informar da viagem (afinal era o final de semana que antecedeu o feriado de 7 de setembro) e me pediu para avisá-la sem demora caso sentisse algum sinal de TP, que ela voltaria.
Marcamos mais uma hora e os intervalos se mantiveram e começaram a diminuir. Por volta de 23h, a Marcia decidiu subir e ficar “de plantão” aqui em São Paulo mesmo. Nessa altura do campeonato, as contrações começaram a ficar mais doloridas, eu me concentrava durante o momento da contração, mas nos intervalos me sentia ótima. Decidi tomar um banho e ficar no chuveiro relaxando. Até aqui eu estava muito bem, achando que ainda havia MUITO pela frente e ainda (acreditem) sem ter certeza de que estava em TP e que a Isadora chegaria em breve.
Conversei com a Katia por telefone algumas vezes. Disse a ela que estava bem e combinamos que ela descansaria mais um pouco e que, quando estivesse mais intenso, eu ligaria. Saí do chuveiro e as contrações começaram a se intensificar. Fiz xixi e notei que o tampão estava saindo. Neste momento, e só neste momento, pensei: é hoje!! Me deu um frio na barriga! Literalmente!
Em mais ou menos meia hora, senti que estava muito tensa e a dor estava começando a ficar forte. Mandei um torpedo para a Katia pedindo para ela me ligar, pois as contrações estavam muito intensas. Pedi para ela vir. As contrações estavam vindo de 3 em 3 minutos e durando cerca de um minuto. Comecei a me desesperar. O Fábio já não sabia muito como me ajudar e eu não encontrava nenhuma posição que me aliviasse a dor. O calor também me incomodou muito, estava muito quente de fato naquela noite e fiquei com o ventilador ligado em cima de mim.
A Katia chegou na hora certa. Eu estava me deixando tomar pela tensão e isso estava tornando a dor insuportável. Ela me abraçou, me acalmou e seu olhar cúmplice e tranquilo foi FUNDAMENTAL naquele momento. Fundamental para mim e também para o Fábio, que já estava no limite de sua condição de me apoiar. Quando a Katia chegou, ele me deixou com ela e foi cuidar de colocar as coisas no carro e organizar tudo para nossa ida à maternidade – o que foi ótimo!
A Katia me ajudou a respirar, me centrou e retomei a concentração – tão importante neste momento. Senti que, se ela não tivesse chegado naquela hora, o desespero e a tensão tomariam conta de mim e só fariam a dor triplicar (se é que isso é possível! Rsrs).
Estava com muita dificuldade de encontrar uma posição de maior conforto. A Katia sugeriu voltarmos ao chuveiro, mas o calor e a água quente não combinaram, tentei sentar na bola debaixo da água, mas não tinha jeito de aliviar. Comecei a ficar nervosa novamente, tensa pela dor e pelo que “estava por vir”. A dor, o incomodo da água quente e a tensão chegaram a me causar náusea e eu achei que fosse vomitar. Decidi sair imediatamente do chuveiro. Nessa hora, a Katia ligou novamente para a Marcia e concluímos que seria o momento de ir para o São Luiz.
Naquele momento eu fiquei muito tensa, pois pensar em entrar no carro, chegar na maternidade, passar por toda a burocracia e os trâmites que eu sabia que existiam lá me apavorou. Eu queria chegar na maternidade e ir para a banheira, mas não queria me deslocar até lá. Comecei a me sentir insegura e dizia para a Katia que estava chateada, pois estava sentindo muita dor e me abatendo muito cedo. E perguntava: se já estou assim agora, como é que eu vou aguentar até o fim? A minha expectativa é de que muita coisa ainda estava por vir.
Katia chegou em casa por volta da 1h15 da madrugada do dia 5/09. Acredito que lá pelas 2h20/ 2h30 nós saímos para o São Luiz. O Fábio cobriu o banco de trás com uma toalha (para prevenir o rompimento da bolsa, que ainda estava intacta), e voou para a maternidade. Não pegamos trânsito nem sequer faróis fechados. Estava muito tensa, mas me concentrei muito, respirei profundamente e consegui me manter relativamente bem durante todo o caminho e nas DUAS contrações que eu tive no trajeto. Ao chegar na maternidade, o que mais me impressionou foi o ar de surpresa e incredulidade dos poucos funcionários que estavam, quase cochilando, na recepção.
A Marcia já estava lá à nossa espera e vê-la foi uma verdadeira benção. Que mulher maravilhosa! Eu estava em um momento difícil, mas nada seria mais tenso do que a ida para a maternidade. O Fábio ficou dando entrada na maternidade e descarregando o carro e nós entramos para a triagem, numa das minúsculas salas de pré-parto do São Luiz.
Tive muita sorte, pois a equipe de plantão conhecia a Marcia e deixou que ela mesma me examinasse. Fiz um xixizinho básico antes e deitei na maca. Havia ouvido dizer que exames de toque, antes e durante o TP, eram muito doloridos, mas naquela altura eu já nem me importava. Porém, ao contrário da minha expectativa, não senti nada!!
Marcia, até com certa surpresa, avaliou: 10 cm, dilatação TOTAL. Ficamos felizes e surpresas, eu um tanto assustada! Ela me perguntou se tinha sentido a tal “vontade de fazer força”. E eu disse que não. Seguindo os protocolos hospitalares, tive que ficar no “cardiotoco” por algum tempo (Explico: Monitor Fetal Cardiotocográfico é um aparelho que monitora os batimentos cardíacos do bebê). Minha impressão é de que foram poucos minutos. A Marcia saiu para ligar para a Dra. AC (obstetra) e Dr. Douglas (pediatra neonatologista) e também avisou ao Fábio. Ele ficou muito feliz e surpreso. Mas teve que voltar, em seguida, para a recepção da maternidade para finalizar os trâmites burocráticos da internação.
A enfermeira me liberou logo do exame e perguntou se eu gostaria de uma cadeira de rodas ou maca para subir para a sala de parto. Eu disse que preferia ir caminhando mesmo. As duas salas de parto normal do São Luiz, chamadas de Labor Delivery Room ou LDR, estavam disponíveis. Escolhemos a número 2, que tem a maior e mais confortável banheira. Fui, amparada pela Katia, caminhando pelo percurso mais longo e inusitado da minha vida.
Isto porque ao me aproximar do elevador, onde uma enfermeira com cara de assustada segurava a porta, senti nova contração, porém algo sem precedentes também ocorreu: senti a tal “vontade de fazer força” ou os puxos, como costuma-se dizer. Olha, foi um negócio muito louco! Hehe... pq é algo realmente instintivo e involuntário. Não há uma análise, uma avaliação prévia, do tipo: hummm, acho que estou com vontade de fazer força. Você simplesmente faz!
A enfermeira que estava na porta do elevador, já com cara de “Meu Deus, o que é isso?”, nesse momento, quase enfartou. Eu olhei para a Katia e ela entendeu tudo. Apressamos o passo. Hoje lembrando dá muita vontade de rir, pois a cena, vista de fora, deve ter sido hilária. Mas, naquele momento, eu comecei a sentir medo.
Tenho total consciência de que esse medo se deu por algumas razões. A primeira delas foi porque o “expulsivo” sempre foi para mim o momento mais delicado e difícil de me imaginar passando por ele. É nessa hora que todos os fantasminhas da nossa mente ganham força e dimensão. Tinha medo da dor, de uma laceração, mas acima de tudo eu tinha medo do nascimento da minha filha. Tinha medo de ter que finalmente enfrentar todos os desafios da maternidade. A mudança irremediável que um filho traz para a vida. Tinha medo da mãe que eu seria. Tinha medo do meu nascimento como mãe. E de fato tive um luto intenso, em relação à morte de quem eu era para o nascimento da pessoa que estou me tornando.
Entrei na Delivery Room 2 do São Luiz e a Marcia já estava lá, preparando a banqueta de cócoras, à nossa espera. Não me senti confortável na banqueta. Quando as contrações vinham eu sentia muito desconforto e a posição não favorecia. Hoje percebo o quanto toda aquela “correria”, movimentação e ambiente hospitalar pode ter potencializado essa sensação. Em instantes, a Dra. Andrea chegou e juntou-se à Marcia para me apoiar. A Katia também permaneceu ao meu lado. Apesar da dor, eu estava bem e consciente de tudo o que estava acontecendo. Sentia que os puxos (a tal vontade de fazer força) estavam cada vez mais fortes.
O Fábio não chegava nunca e eu estava ficando tensa, com medo dele perder o nascimento da Isadora. Além disso, soube que o Dr. Douglas, que acompanharia a chegada da pequena, estava preso em um plantão. Ele solicitou que a Dra. Sandra de Souza nos atendesse. Eu estava ansiosa pela chegada dela, pois só com sua presença é que teríamos liberação para ir para a banheira para, se fosse o caso, a Dorinha nascer na água. Os pediatras plantonistas não autorizam o nascimento na banheira.Nessa altura, o Fábio ainda não tinha chegado e pedi à Katia para telefonar para ele e saber onde estava. O coitado estava “preso” na admissão da maternidade etiquetando as malas!!! O atendente não queria liberá-lo e foi preciso que ele explicasse que perderia o nascimento do bebê para que, finalmente, pudesse subir.
Quando ele chegou, sentou atrás de mim e ficou me dando apoio. Ainda assim, a posição estava desconfortável. As contrações estavam bastante doloridas. Senti quando a bolsa rompeu e o líquido quentinho escorreu. Uma sensação gostosa! Sem sinal de mecônio. Pouco depois, a Sandra chegou e eu finalmente pude ir para a banheira. Digo “finalmente”, mas preciso registrar que todos chegaram muito rápido na maternidade! As meninas perguntaram se o Fábio desejava entrar na banheira junto comigo e ele disse que sim. Não havíamos combinado nada, mas ele sentiu esse desejo no momento. Fiquei feliz. Entretanto, como as nossas malas ficaram aprisionadas na recepção da maternidade, ele não tinha a sunga em mãos e, por isso, teve que entrar de cueca na banheira. E pra piorar: cueca BRANCA! Hehehe...
Tentei encontrar uma posição ideal na banheira, mas as contrações estavam bem intensas e os puxos cada vez mais fortes. Custei um pouco a “relaxar”. Senti vontade de gritar. Isso ajudava a me concentrar e “fazer força”. No dia seguinte, o Fábio disse que, naquele momento, ele conheceu o meu lado “Juma Marruá”. Hehehe ... Naquele momento eu estava com muito medo e pedia para as meninas me ajudarem. No intervalo entre as contrações, ficávamos em silêncio, concentrados – respirando e descansando.
O Fábio ficou atrás de mim e ajudava a me apoiar. A Dra. AC e a Marcia me diziam que a Isadora estava quase nascendo, mas, confesso, eu acha que elas estavam tentando me animar. Perguntei para a Andrea do que dependia o nascimento e ela disse: só depende de você. Nesse momento, eu pensei: é assim? Então, vamos resolver isso AGORA!
Passei a me concentrar muito durante as contrações e a fazer toda força que eu podia. Comecei a sentir o círculo de fogo. Na hora, me pareceu que o tempo parou, mas hoje sei que tudo aconteceu muito rápido. Talvez umas cinco ou seis contrações. Não sei ao certo.
Eu não acreditava que já estava quase acontecendo e as meninas me incentivaram a tocar a cabecinha da pequena, que já havia coroado. Senti os cabelinhos dela e não acreditei. Mesmo assim, disse: “meu Deus, mas ainda falta muito!!”. Todas riram...
O ambiente estava perfeito, cercado de amor, calma, silêncio e, acima de tudo, muito respeito!! Que honra estar naquela sala de parto, com aquelas mulheres maravilhosas, dedicadas e competentes! Além do meu companheiro perfeito, que me abraçava, beijava e procurava me tranquilizar a todo momento.
Na contração seguinte, a cabecinha da Isadora saiu. Que emoção!! A Andrea verificou que não havia circular de cordão e disse que podíamos esperar até a próxima contração para que o corpinho saísse completamente. Senti a Dorinha mexendo, já com a cabecinha para fora. Que sensação indescritível!! A próxima contração me trouxe a pequena, que veio direto para o colo, num chorinho delicioso e emocionante. Ficamos extasiados olhando para ela. O restante do mundo desapareceu e ficamos nós três ali, nos namorando, nos sentindo, nos tocando.
Isadora nasceu às 3h30, do dia 5 de setembro de 2010, pesando 3275Kg e medindo 50 cm. Aproximadamente 50 minutos após nossa chegada na maternidade.
Cobrimos a Dorinha com alguns panos e quando o cordão umbilical parou de pulsar, o Fábio o cortou. A temperatura da água havia esfriado um pouco e achamos melhor manter a Dorinha mais aquecida. A Dra. Sandra pegou a pequena para examinar, com toda a delicadeza e profissionalismo do mundo. Com carinho e atenção, deu Apgar 10/ 10 (nota que avalia a vitalidade e a condição do recém-nascido no primeiro e no quinto minuto de vida), pesou e mediu a minha princesa.
Levantei e fui caminhando para a cama, onde a AC e a Marcia já me esperavam para me examinar. Ainda tinha que parir a placenta!! Tive uma laceração pequena, de segundo grau, que precisou de 2 pontinhos. Essa foi a parte mais chatinha, mas não deu para evitar. Os pontinhos incomodaram nos dias seguintes, mas não me impediram de caminhar, tomar banho, sentar ou mesmo ir ao banheiro.
Como foi tudo muito novo e inusitado, é normal ficarmos receosos e às vezes assustados, mas com o passar dos dias essas pequenas coisas tomam uma dimensão insignificante diante da experiência avassaladora que é parir naturalmente. Eu não trocaria o meu parto por nada nesse mundo. E faria de novo, mil vezes – embora tenha brincado com o meu marido dizendo, ainda na sala de parto, que o próximo filho seria adotado, com certeza! Demos muita risada.
Enquanto eu tomava meus pontinhos, e uma aplicação de ocitocina para ajudar na liberação da placenta e na retração do útero, a Isadora veio mamar. De cara pegou perfeitamente e ficou ali no meu peito pela primeira vez. Eu olhava cada cantinho do seu rostinho e não acreditava que aquele bebezinho lindo estava, até então, morando dentro de mim!!! Em seguida, a Sandra e o Fábio deram um lindo banho de balde na Isadora, que parou de chorar e ficou curtindo o momento!!
Aos poucos, uma a uma das queridas, que amorosamente nos assistiram, foi embora e ficamos nós três, pela primeira vez fora do “ovo de Páscoa”. Enfim juntos! Esperamos amanhecer para avisar a família. Curtimos cada detalhe daquela noite/jornada incrível. E relembramos e revivemos essa história sempre. Às vezes ainda parece um sonho!
Assim, agradeço a Deus pelo presente maior e pela oportunidade de viver um amor tão pleno e intenso.
Agradeço à Fernanda Fioretti, companheira de escolhas e maternidade, pela atenção carinhosa e a indicação preciosa da Dra. Andrea Campos.
Agradeço à Dra. Sandra que tão carinhosamente recebeu e acompanhou a minha filha nos seus primeiros segundos de vida.
Agradeço à AC pela aura de amor, pela prontidão e paciência em todos os momentos. Obrigada por ser essa mulher iluminada e essa profissional rara, competente e sensível.
Agradeço à MK por existir (!!) e ser essa pessoa essencial, essa alma boa, esse sorriso de paz, esse olhar cúmplice. Obrigada por cada segundo de dedicação e por todas as horas de atenção e conselhos, que se seguiram no pós-parto.
Agradeço à minha querida instrutora de yoga, doula, amiga e mulher de fibra Katia Barga pelo olhar, pela confiança, pelo toque, pela palavra, pelo silêncio, pelos registros – todos no momento certo, da melhor maneira possível. Obrigada, minha querida, você mora no meu coração!
Agradeço ao meu companheiro incrível por embarcar comigo nesta grande aventura, que teve nessa experiência transformadora apenas o seu ponto de partida! Obrigada pela dedicação, pelo amor, pelo carinho e pelo apoio. Obrigada por superar junto comigo medos e ignorâncias e comprar essa briga juntos.
Obrigada, por fim, à minha princesa Isadora por me escolher como mãe, por me desafiar a ser melhor, por me ensinar a amar incondicionalmente, por perdoar meus defeitos e me acariciar a alma todos os dias com seu sorriso de gengivão, que agora já tem DOIS dentinhos!!! AMO-TE hoje e sempre e mais! Obrigada.